quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Os enganos da percepção – parte I


Há mais de dois mil anos, o filósofo Platão, na célebre passagem do livro VII d’A República, intitulada “Alegoria da Caverna”, levantava dúvidas sobre a nossa real capacidade de compreensão da realidade pela percepção dos sentidos. O pensador nos lança a hipótese de prisioneiros que nunca avistaram o mundo exterior, estando desde sempre confinados no interior de uma caverna, presos de tal forma que não podiam ver a entrada do local. Seriam esses homens capazes de identificar e diferenciar o real do falso? Segundo Platão, eles veriam sombras projetadas ao fundo da caverna, mas seriam levados a acreditar, pelos seus sentidos, que aquelas meras sombras seriam dos objetos reais. 
Como sabemos, essa hipótese quer ilustrar a pouca confiabilidade das conclusões que obtemos a partir daquilo que experimentamos pelos nossos sentidos. Platão defendia que apenas por meio da filosofia, mais precisamente pela dialética, é que se poderia alcançar a verdade, livre dos enganos dos sentidos, e atingir, assim, o conhecimento das coisas.
Mais tarde, no século XVI, René Descartes, em uma releitura da Alegoria da Caverna, estende a dúvida a respeito da confiabilidade da percepção sensível e enuncia a possibilidade de serem errôneos todos os nossos pensamentos fundados sobre os aspectos dos nossos sentidos, inclusive aquele que me afirma que estamos aqui neste momento.
Nós já exploramos a problemática sentidos x realidade x conhecimento, tendo, inclusive, nos debruçado sobre os autores e princípios supracitados.
Em uma análise apressada, porém, esses problemas podem parecer sem importância ou um exagero desses autores, uma questão sem fundamento, diante da realidade dos fatos. Contudo, você está seguro de que tudo o que vê é real?
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Legenda: Olhe fixamente para o centro da imagem. Você perceberá que as bolas pretas parecem aumentar de tamanho. Por akihiko.japan. Creative Common. Atribuição CC BY-ND 2.0
Repare bem na sequência de imagens abaixo.

Estas imagens são algumas das obras do artista plástico Victor Molev, que brinca com nossos sentidos criando imagens dúbias, nos fazendo refletir sobre a nossa capacidade perceptiva. Ao nos depararmos com figuras como essas, entendemos que talvez os problemas enunciados por Platão e Descartes não fossem tão banais assim.
Voltando à filosofia, ou melhor, ao problema da percepção por meio dos sentidos, a partir do século XIX, foi desenvolvida a linha de pesquisa denominada Fenomenologia. Tal perspectiva sustenta que os objetos do conhecimento devem ser encarados tais como aparecem, isto é, a partir da forma como se apresentam à consciência. Isso significa que para os defensores dessa linha de pensamento não há como entender a realidade separada do sujeito que a vivencia, que a apreende. Ou seja, ao contrário do que defendeu o racionalismo de Descartes, não haveria uma consciência pura. Também, contrariamente aos empiristas, não existiria uma realidade em-si. Ou em outras palavras, “a consciência é sempre consciência de algo”, como afirmou Edmund Husserl, fundador da Fenomenologia.
Por Jaqueline Santos
REFERÊNCIAS:
ARANHA, Maria Lúcia. Filosofando. 2.ed. rev. atual. São Paulo: Moderna, 1993.
BBC BRASIL. Americano cria arte em 3D nas ruas de todo o mundo.Disponível em: . Acesso em: 13 out. 2011.
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2000.
WENNER, Kurt. Street Painting. Disponível em: . Acesso em: 13 out. 2011


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